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Crônicas

A prisão de Joel!

Luiz Fernando Panico (*)



Aos primeiros sinais do amanhecer daquele que seria o último dia de verão, fui ao encontro de Joel. Enquanto ouvia o meu canário do reino cantar, passei a trocar a água, o alpiste e a limpar a sua gaiola. Assim, com a “casa arrumadaâ€, não seria surpresa que ele externasse a sua alegria, pulando de um poleiro para outro. Naquele momento, fiquei a imaginar que a minha presença o deixava feliz, mas, depois de uma breve reflexão, não encontrando resposta para aquele desejo, achei melhor seguir a minha rotina de todas as manhãs. Ao abrir a janela da sala que dava para um terreno arborizado, passei a sentir o prazer de respirar o ar umedecido pelo orvalho da noite.

Com a natureza tão próxima, o meu canário, que nasceu para viver em liberdade, tornou-se mais serelepe e passou a cantar com a suavidade de sempre. Nesse momento mágico, era visível o seu encantamento com os galhos das árvores, movidos pelos ventos.

Depois de conviver com esse cenário de ilusões, voltei a refletir sobre a relação conflitante que me atormentava há algum tempo.

“Como pode uma pessoa desejar que a sua presença seja agradável se ela mantem preso quem nasceu para viver em liberdade? Não seria sensato imaginar que o canto do meu canário fosse um protesto sobre as suas condições de vida?â€

Não querendo perder o encanto de sua companhia, num lampejo de hipocrisia, externei um discreto sorriso.

Atento aos seus movimentos, ele mexia a cabeça de um lado para outro. Logo em seguida, para minha alegria, ele voltou a cantar.

Então, insinuei com prazer:

“Seria o seu canto um desejo para que eu deixasse a tristeza de lado?â€

Envolvido pela emoção, passei a vislumbrá-lo solto nas matas a voar sem destino. Em certo momento, deixei os questionamentos de lado, e, num impulso incontido de libertá-lo, abri a portinhola da sua gaiola, ao pressentir que ele iria cantar o prenúncio da sua liberdade. Ele seria feliz, pois esse era o sentido de sua existência: a liberdade para voar.

Aquele espaço de tempo foi para mim uma eternidade, mas, para minha surpresa, Joel não demonstrava o desejo de se aproximar daquele pequeno espaço. Com o passar do tempo, passei a acreditar, por seu comportamento, que poderia ter uma relação prazerosa com o local que vivia. Com a angústia se dissipando, mas ainda receoso da verdade, me perguntei:

“Poderia ser um desejo egoísta de minha parte ou ele estaria receoso de enfrentar as adversidades de um mundo desconhecido?â€

Demonstrando-se alheio ao meu mundo de conflitos, Joel continuava com seus movimentos graciosos num cantar sem fim. Convencido de que eu não iria deixar de ouvir a beleza de seu canto no despertar das minhas manhãs, com um sentimento imensurável de felicidade, fechei a portinhola da sua gaiola.

Preocupado com o horário do meu trabalho, me despedi um tanto afoito da minha mulher e dos filhos. Ao passar pelo meu canário, lhe perguntei:

- Você é feliz Joel?

Ele mexeu a cabeça, com a mesma meiguice de sempre e voltou a cantar. Depois de lhe abanar a mão num sinal de até logo, passei a ouvir a suavidade do seu canto enquanto esperava pelo elevador.

Dominado pelo instinto, abri a porta, me aproximei da sua gaiola e me despedi do companheiro de belas manhãs:

- Você é livre, mas eu estou indo para a minha prisão de rotina.



(*)Luiz Fernando Panico - Ginecologista-Obstetra

PS: Já se passaram quase vinte anos quando este canário do reino entrou livremente pela janela da sala do nosso apartamento. Entre o sorriso do meu filho, ainda uma criança, e o cantar do seu novo amiguinho, a quem ele chamou de Joel, criou-se uma bela amizade.

Com esta crônica, pretendi mostrar os dois lados de uma vida: a pureza da criança, onde o amor está sempre presente, e o ser humano maduro, preso a preconceitos, tornando seus sonhos cada vez mais distantes.







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